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April 16 2009 4 16 /04 /April /2009 16:25

Artigo publicado na edição de 16/04/2009 do semanário Zambeze
Estrategicamente pensando

A água e o desenvolvimento sócio-económico de Moçambique

Por: Pedro Simone*

5.            Porquê Moçambique precisa de barragens (incluindo Mpanda Kuwa)

Nesta sequência de artigos, a presente edição estava reservada à discussão do papel das instituições financeiras no desenvolvimento de projectos de irrigação em Moçambique. Porém, porque a questão das barragens é crucial neste processo e necessita de alguma discussão aprofundada, particularmente quando estão a crescer em Moçambique vozes ambientalistas críticas ao projecto de Mpanda Kuwa, o papel das instituições financeiras vai ser adiado por uma edição para dar espço à esta questão devido à sua urgência e pertinência.

Nos últimos dias tem sido publicado na imprensa nacional notícias subsequentes relativas ao sentimento crescente de inquietação que o projecto da barragem de Mpanda Kuwa tem criado nos ambieantalistas. Tem sido evocado que seria um desastre ecológico construir mais uma barragem no curso do rio Zambeze. As preocupações dos ambientalistas parecem naturais e legítimas quando se prentende um desenvolvimento sustetável para Moçambique. É natural que qualquer projecto desta envergadura tenha que ser acompanhado por uma componente ambiental no seu estudo de viabilidade e todos afectados ou/e iteressados queiram ver os seus interesses salvaguardados. Assim sendo, o estudo de viabilidade tem que ser necessariamente detalhado porque a grandeza do projecto assim o exige: envolve investimentos muito altos e é suceptível de várias implicações quer económicas, quer sociais e principalmente ambientais.

Nesta sequência, a grandeza de um projecto de construção de uma barragem como a de Mpanda Kuwa exige que a sua avaliação seja feita à sua medida. Por outras palavras, é preciso olhar para Mpanda Kuwa como um sistema todo, ou seja, fazendo uma análise integrada de todos os componentes do sistema incluindo a componente ambiental. Porque a componente ambiental é que está no centro da polémica, começemos por ela. Sem ter-se a possibilidade de se ver o relatório preliminar do estudo do impacto ambiental pode-se logo a partida antever-se algumas implicações negativas.

Primeiro, A barragem vai alagar vários hectares de terra à montante (na zona onde vai se formar a albufeira), resultando em mudanças profundas da fauna e bravia da região, com implicações negativas para parte das populações residentes nas margens do rio Zambeze, uma vez que vão precisar de ser deslocadas e vão perder o seu sustento baseado nos recursos marinhos provenientes do próprio rio, nas condições actuais. No entanto, se o projecto da barragem incluir um programa sustetável de reassentamento das populações potencialmente afectadas, o impacto nelas pode ser minimizado. Por outro lado, a albufeira que se vai formar, vai criar novas condições propícias para o desenvolvimento da pesca à várias escalas. Portanto, nem tudo vai-se perder.

Segundo, Existe um risco de se perder parte de espécies marinhas à jusante devido à altas temperaturas com que a água pode ser descarregada da barragem ou devido à retenção de sedimentos na albufeira, alterando o ambiente aquático. Numa barragem Sul Africana, o efeito da temperatura chegou a afectar o processo de reprodução de crocodilos. À altas temparaturas, há uma tendência de prevalência de um género contra o outro, o que pode perigar a sua futura existência. O projecto tem que abordar estas questões para eliminar ou minimizar os efeitos, prevendo sistemas de arrefecimento apropriados antes de se descarregar a água para o grande “habitat” à jusante. Por outro lado, barragens modernas são normalmente desenhadas com sistemas de descargas especiais que garantam a retenção ou descarga de volumes de sedimentos desejados. Assim sendo, estes são os aspectos que os ambientalistas devem verificar no projecto e propor medidas correctivas, se é que elas não fazem parte do projecto, e existem grandes possibilidades de serem resolvidos.

Terceiro, existe o risco de se colocar as áreas de inundação (marshlands) em situação de carência da água porque muita parte dela vai ficar retida na barragem. As áreas que são temporatiamente inundadas pelas cheias de qualquer rio são muito importantes para a manutenção do ecossistema e para a produção agrícola. Existem exemplos negativos da distruição destas áreas na Australia, no Iraque e Aral Sea,  no Urzebisquistão, com impactos irreversíveis. No caso de Mpanda Kuwa, é preciso ter em conta que hidroeléctricas usam a água não duma forma consumista. Isto é, contrariamente ao uso doméstico, industrial ou agrícola, a água usada para mover as turbinas das hidroeléctrica é libertada com o mínimo de poluição, sendo assim, potencial para ser usada por outros consumidores ao longo do rio. Por outro lado, é necessário que o projecto tenha claramente os caudais ambientais mínimos que devem ser descarregados pela barragem e especificados nas condições de operação da mesma. Se estes caudais forem bem definidos e implementados, a barragem pode tornar-se uma mais valia para o ambiente, porque vai garantir que os caudais do rio sejam mais regulares. Na ausência de uma barragem, existe o risco de inundação excessiva na época das cheias e falta de água total na época seca. Por exemplo, países como Australia a enfrentar secas longas, estariam com a maior parte dos seus rios completamente secos por mais de 2 anos se não tivessem barragens. Recordando mais uma vez que a região Austral de África está em risco de ter cheias longas e secas longas devido ao impacto das alterações climáticas. Portanto, a barragem pode atenuar esta variabilidade. Adicionalmente, a regularização dos caudais é particularmente importante para evitar situações de cheias que têm afectado as populações do vale do Zambeze nos últimos anos, com custos sociais e económicos. Portanto, como dizem os Americanos, aquilo que parece ser um problema, pode ser transformado numa oportunidade ambiental.

Por último e o mais importante, a barragem de Mpanda Kuwa está projectada para produzir energia. A energia hidroeléctrica é uma energia limpa com impacto insignificante sobre o ambiente, particularmente no que diz respeito a emissão dos gases de estufa. Com a construção desta barragem, o país vai aumentar a sua capacidade de produção de energia. Isto significa que o país pode cobrir todas as suas necessidades internas com energia limpa e renovável e ainda exportar energia limpa para o mercado regional. Este seria um ganho de grande dimensão ambiental porque a barragem não só contribuiria para a manutenção das condições ambientais locais e nacionais, como também à nível da região Austral de África. Portanto, como se pode ver, mesmo do ponto de vista ambiental, há potencialmente muitos ganhos com este projecto e não só.

Economicamente, os recursos naturais existentes em qualquer região ou país devem ser usados correctamente para o benefício do ser humano. Benefício do ser humano significa a satisfação das suas necessidades básicas, a melhoria da sua qualidade de vida, o seu desenvolvimento social e económico. É de esperar que uma comunidade localizada junto ao mar tenha a pesca como uma das suas actividades económicas, da mesma forma que países ricos em petróleo capitalizam a exploração deste recurso. Países como Australia, Africa do Sul e Chile têm as suas economias indexadas aos minérios de que são ricos e a devida atenção é dada ao sector. No caso concreto de Moçambique, a água é um dos maiores recursos para impulsionar o desenvolvimento e todo o investimento que possa aproveitar as capacidades nelas existentes para o desnvolvimento sócio-económico deve ser capitalizado. Vejamos algumas vantagens económicas do caso concreto da barragem de Panda Kuwa.

Primeiro, o aumento da capacidade de produção nacional de energia pode colocar o país numa posição muito vantajosa. Vai aumentar o volume de exportações para os países da região. A África do Sul que é um dos clientes da energia de Cahora Bassa encontra-se numa situação de “déficit” energético, o Zimbabwe está a entrar na fase de estabilização política e vai certamente precisar de mais energia e já está em perpectiva um outro mercado, com o projecto da linha eléctrica para o Malawi. Os ganhos com a exportação da energia não só vão diminuir ou elimiar o desiquilíbrio na balança de pagamentos, como também vão ser uma grande fonte de receitas para o Estado investir em programas sociais tais como educação, saúde, água e outros programas de combate à pobreza. Recordar que Moçambique ainda tem mais de metade da sua população vivendo em condições de pobreza absoluta que precisam destes investimentos para poderem ter condições sociais acitaveis.

Segundo, tendo uma capacidade de produção de energia acrescida, o país fica potencialmente atractivo ao investimento nos sectores agrícola e industrial. Para ilustrar a importância deste facto, temos apenas que recordar que uma companhia agrícola em Manica está a ameaçar retirar-se do mercado porque a ligação à energia de Cahora Bassa está atrasada. A se concretizar, uma parte dos Moçambicanos vai para o desemprego, com as respectivas consequências sociais. Paralelamente, entre outros motivos que limita a expansão do projecto Mozal e a crise que resultou no despedimento colectivo dos 80 trabalhadores ainda este ano, evoca-se a limitada capacidade energética que a Eskom pode fornecer à este empreendimento. Estes factos, mostram quão é importante que Moçambique desenvolva a sua capacidade interna de produção de energia, particularmente quando se trata de energia limpa.

Adicionalmente, a construção de uma barragem resulta em grandes reservas de água que devem ser tomadas como uma grande opotunidade para o desenvolvimento. Estas reservas criam condições propícias para o desenvolvimento da navegação, prática da pesca de grande escala, prática de desportos aquáticos e sobretudo a atracção do turísmo. Se um plano integrado for incluso no projecto como sugerido nas edições anteriores, a produção agrícola a jusante da barragem poderá ser também impulsionada. Portanto, são enúmeras as vantagens económicas directas e indirectas associadas à um projecto desta natureza.

Do ponto de vista social dois aspectos principais. Primeiro, todas as actividades descritas anteriorimente vão criar oportunidades de empregos para muitos Moçambicanos e consequentemente melhorar os seus rendimentos e as suas condições sociais. Segundo, mais uma barragem sobre o rio Zambeze ou em qualquer rio de Moçambique vai garantir a melhor regularização dos caudais a jusante, minimizando a possibilidade de ocorrência de cheias cíclicas. Importa recordar que nos últimos anos, o vale do Zambeze tem sido uma fonte de drama social resultante das cheias que destrõem tantos as habitações como as fontes de subsistência das populações residentes à riberinha, com elevados custos para os fundos públicos.

O exemplo de Mpanda Kuwa mostra que mesmo do ponto de vista ambiental existem ganhos enormes com sistemas de regularização dos caudais dos rios. Portanto, só se o risco de falha por abalos sísmicos for eminente é que este tipo projectos pode não ser viável. Assim sendo, sugere-se que o debate ambiental sobre Mpanda Kuwa ou qualquer outra barragem, seja feito de uma forma positiva para sugerir soluções para a melhoria do desempenho global dos projectos e não para veta-los à qualquer custo. A água é poder, e se Moçambique tem esse poder, é preciso exerce-lo para o bem estar dos seus cidadãos. E  como uma das áreas onde este poder deve ser exercido é na irrigação, na próxima edição retornamos à irrigação com o das instituições financeiras.

 

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